O cinema já apresentou muitos tipos de casais, o amor à primeira vista, o casamento, o namoro inocente entre duas pessoas felizes que são apenas um pouco solitárias. Já conhecemos bem essa história. E, felizmente, O lado bom da vida – mesmo com esse título clichê na tradução brasileira – se despe do lugar comum e apresenta um amor que cresce gradualmente durante o filme entre duas pessoas que, no passado, tiveram a vida destruída e, agora, tentam reconstruí-la com as esperanças que sobraram.
Bradley Cooper interpreta Pat Solitano, um rapaz que perde o emprego e o casamento após um surto que põe em risco a vida de outras pessoas. Ele passa oito meses numa clínica de reabilitação e, ao voltar para a casa dos pais, está decidido em recuperar o tempo perdido. Do outro lado está Tiffany, interpretada por Jennifer Lawrence, uma moça agressiva que tenta superar a morte repentina do marido e o desequilíbrio que sofreu após essa perda. Esse certamente seria um casal improvável, mas que se mostra possível, pois ambos recebem o olho torto e duvidoso dos outros ao redor por serem considerados desajustados.
O filme funciona extremamente bem e envolve o espectador desde o início. A história é simples e o desenrolar dela também. Na verdade, é um filme que dá espaço para os atores construírem personagens complexos, muitas vezes desvendados por um olhar ou atitude, do que por uma frase dita. A começar por Bradley Cooper. Pat se perturba com uma música que ouve e se revolta com a morte de um personagem em um dos livros de Hemingway. Tudo vem de sensações que passamos a compartilhar com o personagem. Ele acorda os pais revoltado com a morte do personagem, esbravejando contra Hemingway, e a gente adota o argumento de Pat. Ele expõe a fragilidade da vida, nesse momento, pelo ato de fúria, que é a sua defesa, ao perceber que as expectativas para a vida, muitas vezes, são apenas isso, esperanças que não vão se concluir ou que são derrubadas por uma reviravolta da história. Ou seja, junto a Pat, até mesmo essa raiva por um escritor já morto se torna convincente.
No caso de Jennifer Lawrence, parece que ela não está atuando, tamanha a naturalidade com que a jovem atriz compõe Tiffany. Ela é agressiva, mas vulnerável, extremamente sincera, mas oculta os sentimentos mais profundos. E, mesmo sendo características contraditórias, elas funcionam bem na composição da personagem. Os momentos em que ela conversa com Pat e as mudanças bruscas de humor nunca soam forçadas, tamanha é a competência de Lawrence ao dar vida à personagem.
Assim, o filme mescla tensão, drama e comédia na medida certa, com um final contido e realista, não como nas comédias românticas em que há uma exaltação da superação. Essa superação já permeia todo o filme, com a naturalidade que poucos filmes conseguem imprimir. A verdade é que todos os personagens do filme possuem uma fragilidade que optam por esconder. E, tendo o futebol americano como o ponto que os une – além dessa fragilidade -, o filme demonstra que a estratégia de um jogo, assim como a vida, é lidar com a perda e tentar uma nova jogada, saber quando recuar para voltar ainda mais forte.
Creio que você não poderia ter descrito de maneira melhor esse filme. Não é um filme convencional, não é uma situação convencional e eu acho que, o principal do filme, não é mostrar o casal e sim, como, todos que apontam as “anormalidades” do casal, as possuem em maior ou menor escala, mas as mantêm escondidas sob o véu que a sociedade cobra que exista e que, sempre em algum momento, um ou outro deixa escapar. Acho que o filme pode ser descrito da seguinte maneira: como desfocar o foco do filme. Muito interessante!
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