cinema · resenhas

Oscar 2015 | O Jogo da Imitação

Direção: Morten Tyldum

Com Benedict Cumberbatch, Keira Knightley, Matthew Goode.

EUA/ Reino Unido – 2014

Indicado a sete categorias do Oscar 2015: Melhor filme, Melhor ator (Benedict Cumberbatch), Melhor atriz coadjuvante (Keira Kinightley), Melhor direção, Melhor design de produção, Melhor trilha sonora, Melhor roteiro adaptado.

poster the imitation gameO Jogo da Imitação não é apenas um filme incluído na lista do Oscar 2015. Ele é um serviço à verdade ocultada acerca da história de Alan Turing, o pai do computador moderno. Bem construído e com um elenco eficiente, O Jogo da Imitação apresenta a saga deste jovem matemático, contratado para uma missão secreta pelo Governo Britânico com a função de desvendar o Enigma e vencer a Segunda Guerra Mundial.

O código era constantemente alterado em um complicado e engendrado conjunto de criptografia que permitia o envio de informações diretas pelo rádio sobre a posição alemã de ataque à Inglaterra. A cada dia que uma equipe tentava pelo menos descobrir qual era a mensagem enviada, deparava-se com sentenças simples que nada indicavam sobre os intentos de Hitler. E logo, todo o trabalho de um dia ia por água abaixo, pois o código ganhava novos caracteres. Era impossível para a mente humana obter um resultado.

O papel de Alan Turing, então, foi o de ousar criar uma máquina – que posteriormente ganhou seu sobrenome – para que ela conseguisse estabelecer a sequência em letras do que o Enigma emitia. Era apenas Turing, a máquina e o trabalho de um pequeno grupo de matemáticos em Bletchley Park. Eram heróis ocultos que nenhum livro de História deu seu devido reconhecimento.

O filme apresenta os anos de trabalho da equipe enquanto inclui flashbacks da dura adolescência de Turing, um menino prodígio, e a acusação concedida à Turing de obscenidade, por ser homossexual. É difícil notar como soubemos tão pouco de Turing nos últimos 50 anos. O filme deixa evidente como o Cinema pode ser importante para apresentar histórias desconhecidas, explicando os pontos mais importantes da vida de Turing, sem explorar com saídas fáceis e excessivamente dramáticas as vivências do matemático.

 A atuação de Benedict Cumberbatch é o grande ponto que concede grandiosidade ao filme. O seu trabalho feito com excelência justifica sua indicação ao Oscar como Melhor Ator e consegue tornar Turing tateável e próximo desta geração que pouco sabe de seu trabalho. É surpreendente ver que um ator que já deu vida a tantas figuras emblemáticas, de Sherlock Holmes a Van Gogh, ou a voz de Smaug e Stephen Hawking, consiga dar singularidade a Turing. É uma versatilidade pouco encontrada atualmente. Benedict apresenta em suas expressões a devoção heroica de Turing em continuar com seu projeto, apesar de uma recusa social incessante que ele sofre desde a adolescência pelo gênio que ele é. Turing sofre as mais desumanas situações por ser homossexual, uma realidade que ocorreu com cerca de 45 mil homossexuais, que tinham apenas como opção receber castração química ou a pena de morte.

A composição do filme de Morten Tyldum é de uma delicadeza singular e bem equilibrada. A temática histórica em nenhum momento soa densa em suas informações e o ritmo fluido do filme de mantém. Sem exageros, sem cobrar falas significativas, vemos Turing em suas faces, a arrogância, a dificuldade em lidar com os próprios códigos humanos de convivência, a relação com os outros matemáticos que o ajudam. Porém, o mais interessante é ver que ele encontrou reconhecimento do próprio heroísmo na figura de Joan Clarke (Keira Knightley), uma matemática que também encontra o desprezo pelo seu talento apenas por ser mulher. A mesma sociedade patriarcal que não dá chances a ela de trabalhar em cargos exclusivamente masculinos pune Turing e considera a homossexualidade motivo de punição.

Este fato revela algo muito destacável sobre o contexto. Turing não opta em quebrar o Enigma para ser o herói que lutará pela sua pátria. Ele tem o interesse genuíno de descobrir esse código que de alguma forma pode dar fim a uma guerra que levou ingleses à pobreza e à fome. Tratando-se de uma guerra em que os políticos do mais alto cargo que contratam Turing querem a sua hegemonia de volta, é contraditório ver que esses que se assumem como os heróis dos grandes feitos que pôs fim à Guerra pune aquele que realmente possibilitou este fim.

O desenvolvimento de O Jogo da Imitação é simples e bem eficiente. Contudo, alguns fatos da vida de Turing poderiam ter sido acrescentados ao filme para dar mais dignidade ainda à sua figura, que sofreu demais no fim da vida. Esta ausência de fatos importantes revela que realmente era necessário mencionar que Turing passou a mancar por consequência dos fortes hormônios que tomava, eles eram postos em um dispositivo inserido em sua perna para evitar as dolorosas injeções. Por conta disso, Turing, que era um atleta de nível olímpico, não pôde mais correr. Além disso, tais hormônios provocaram mudanças no corpo de Turing, com o aumento dos seios e constantes tremores.

Outro fato curioso, nunca realmente confirmado, foi o seu suicídio. Alguns consideram que ele teria comido uma maçã envenenada. Outras versões comentam que, devido ao contato dele com o cianeto e a ausência de uma carta de despedida, Turing teria sido vítima do envenenamento ou até mesmo assassinado por agentes a mando da CIA. De qualquer forma, apesar das dúvidas sobre sua morte, há histórias que consideram que a maçã mordida da Apple teria sido escolhida como homenagem a Turing.

Se hoje é possível comunicar-se com alguém em outro país ou redigir mesmo esta atual resenha, o trabalho começou com o desenvolvimento desta máquina que permite tornar legível as mais distintas criptografias por meio de um algoritmo e a possibilidade de armazenar informações, o que um computador digital executa. Porém, o filme O Jogo da Imitação mostra muito mais do que isso. Ele nos leva a conhecer uma história pouco conhecida no cinema, antes contada apenas no filme de 1990 da BBC, Breaking the Code. Uma figura emblemática que aceitou abrir mão do reconhecimento para que a guerra terminasse. Fez também pelo amor com que vivia uma vida em meio aos números e o respeito pela grandiosidade da matemática. Mais ainda, O Jogo da Imitação coloca diante dos nossos olhos a representação de Alan Turing e sua pequena equipe como os grandes heróis que a guerra esqueceu.

Antes os documentos sobre Turing eram secretos, mas agora se tornaram públicos e estão aqui. Você pode também ler o artigo escrito pelo Turing sobre seu teste que analisa se uma máquina pensa como um humano, aqui. Para saber mais da vida de Alan Turing, procure os livros O Homem que sabia demais e Alan Turing – The enigma.

2 comentários em “Oscar 2015 | O Jogo da Imitação

  1. Nossa, estou de cara com seu texto maravilhoso, que consegue fazer justiça ao filme. Como Sherlockian, eu estava muito ansiosa para ver Benedict Cumberbatch interpretando mais um gênio e ele realmente não me decepcionou em sua atuação como Alan Turing. Além disso, eu adoro matemática e fiquei muito contente em ver um filme que destaca essa área na lista dos indicados ao Oscar.
    Mais uma vez, parabéns pelo texto – eu colaboro em um blog e também resenhei The Imitation Game, mas agora chego a ter vergonha da minha humilde resenha perante a sua. Parabéns!

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    1. Cris, muito obrigada por ter lido a resenha e comentado! Fico muito feliz que tenha gostado da resenha, sempre dá trabalho mês de Oscar sair correndo para ver e escrever haha A história do Turing foi muito bem representada. Dei uma olhada no seu blog e achei lindo, inscrevi meu e-mail para acompanhá-lo! Se quiser fique de olho nas outras resenhas! beijos!

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